Os Inimigos, os Vizinhos Associados e os Inquilinos de Colmeias Meliponini

O universo das abelhas sem ferrão vai muito além do trabalho das operárias e da produção de mel. Dentro e ao redor de uma colmeia Meliponini, existe uma verdadeira comunidade formada por aliados, oportunistas e inimigos naturais. Compreender quem são os inimigos, os vizinhos associados e os inquilinos de uma colmeia Meliponini é essencial para o manejo sustentável e a preservação dessas espécies tão importantes para a biodiversidade.

Essa complexa teia de interações pode impactar diretamente a saúde da colmeia e a produtividade do meliponicultor. Neste artigo, vamos explorar quem são esses personagens que convivem — ou entram em conflito — com as abelhas sem ferrão, e como é possível manter o equilíbrio nesse delicado ecossistema.

Os Inimigos

Apesar de serem bem organizadas e protegidas, as colmeias de abelhas sem ferrão enfrentam ameaças constantes de predadores, parasitas e até mesmo da ação humana. Esses inimigos podem comprometer toda a colônia se não forem identificados e controlados a tempo.

Nas colônias de Meliponíneos às vezes podem ser encontradas não apenas a barata doméstica (Periplaneta americana), mas também espécies silvestres desse inseto. Elas vivem somente nas colônias fracas, onde às vezes ficam prisioneiras. Entram quando são pequenas. Depois, crescem e não podem mais sair. São asquerosas, por isso, devem ser removidas, mas não são um inimigo perigoso.

Os cupins ou termitas são muito importantes para os Meliponíneos. Estes frequentemente fazem os seus ninhos em ocos de árvores escavados pelas termitas. Tais ocos, quando desocupados por esses insetos, podem ser aproveitados pelos Meliponíneos, como local de residência. Cumpre acrescentar mais um fato importante: às vezes as termitas destroem a madeira das colmeias das abelhas tornando-se um problema muito grave, pois podem fazê-lo em questão de meses. 

Os barbeiros ou chupanças são insetos muito conhecidos porque diversas espécies são transmissoras da moléstia de Chagas. Apiomerus é um gênero que ataca as abelhas indígenas, matando-as e sugando-lhes o conteúdo líquido do corpo. Eles esperam as abelhas, para atacá-las, principalmente nas flores. Às vezes, são vistos no próprio meliponário, matando as suas vítimas perto da entrada das colmeias ou junto a um ninho silvestre. Quando os Apiomerus são encontrados, devem ser mortos pelo meliponicultor, devendo ser exterminados um a um, pois não deve fazer uso de pesticidas.

A “traça pequena” (Galleria melonella L), há muitos séculos conhecida como praga da apicultura, pode estar presente também em colônias de abelhas indígenas brasileiras. Às vezes, as suas larvas podem ser encontradas nas membranas do invólucro do ninho, onde formam pequenos calombos mais claros e algo compridos, no interior do cerume. Para combater as traças, esses calombos devem ser retirados manualmente e destruídos.

Os forídeos são insetos que pertencem à ordem dos Dípteros, da qual também fazem parte as moscas, os mosquitos, etc. Há diversos gêneros de forídeos que podem frequentar as colônias de Meliponíneos: Pseudohypocera,  Aphiochaeta, Melitophora e Melaloncha, sendo Pseudohypocera a mais preocupante. Os adultos de Pseudohypoecera são pequenas mosquinhas, muito ágeis, que nas colmeias dão corridinhas e saltos rápidos, voando pouco. Podem ser vistos dentro das colmeias ou do lado de fora das mesmas, procurando entrar. Esses adultos pouco ou nenhum estrago fazem, no entanto, as suas larvas constituem um perigo para os Meliponíneos. Elas são pequenas e vorazes, parecendo  “vermes” brancos e são capazes de exterminar uma colônia de Meliponíneos, quando estão  em grande número. Comumente, são vistas dentro dos potes de pólen, mas também podem liquidar os favos de cria. 

Os criadores de abelhas consideram as formigas como o seu inimigo n° 1. Porém, em geral as abelhas sem ferrão se defendem delas, satisfatoriamente, quando as suas colônias estão em estado normal. Os Meliponíneos calafetam muito bem os seus ninhos e é difícil às formigas passarem pela entrada guardada. 

Formigas são as principais predadoras, principalmente as do gênero Solenopsis (como a temida formiga-lava-pé), que atacam em massa para roubar mel, cria e cerume. Quando a colônia está desorganizada ou fraca, a defesa das abelhas é sobrepujada e a colônia é destruída. Se for preciso afastar as formigas, o melhor é passar um grude especial na parte inicial dos ferros de suporte da colmeia. 

Entre os marimbondos e vespas sociais mais comuns, os Polybiinae (chamamse também Epiponinae) e os Polistinae que fazem ninho de cartão nos beirais de telhados, aparentemente não atacam abelhas. Porém, há uma outra espécie de Polybiinae que pode matá-las. Entre elas está Polybia ignobilis Hal. (Krombein det.), fazedora de ninhos em ocos ou em outros lugares abrigados. É um marimbondo relativamente grande, inteiramente preto, possuidor de fortes mandíbulas as quais esmagam facilmente as abelhas. Eles as atacam quando visitam uma flor. Com isso, o atacante obtém os líquidos do corpo das suas vítimas, inclusive o néctar 

que estas haviam colhido. 

Todos sabem que as aranhas fazedoras de teias apanham insetos. As teias construídas junto às colmeias causam a morte de certo número de abelhas e devem ser constantemente removidas. Outras espécies, como as Nephila sp, aranhas semi sociais cujo dorso do abdome é esverdeado-pontilhado.Elas fazem teias enormes, entre as árvores e arbustos, frequentemente havendo grupos de teias. Isso representa um perigo para as abelhas. 

O ácaro Pyemotes tritici é capaz de matar as abelhas sem ferrão. São ácaros de tamanho diminuto. As fêmeas, “prenhas” com muitos “filhotes”, aparecem como pequenos pontos sobre a cria das abelhas matando-as no estágio de pupa, ou seja, filhotes de abelhas na fase final do seu desenvolvimento nas células de cria. No entanto, podem liquidar todos os habitantes da colmeia, tanto a cria como os adultos. O que já se sabe sobre os Pyemotes indica que, em certas circunstâncias, eles constituem um risco para a criação de abelhas no semi-árido do Nordeste e provavelmente nos cerrados do Brasil Central. São regiões com extensos períodos secos e os Pyemotes podem ser levados para as colméias pelas abelhas campeiras, com o pólen colhido por elas, pois eles se alimentam de pólen.

Não se justifica combater aves por causa de Meliponíneos. Os estragos causados pelos pássaros insetívoros que apanham abelhas no ar, são quase sempre pouco importantes. Contudo, é muito conveniente proteger as colônias do ataque dos pica-paus, tapando com pedaços de lata ou de tela metálica as extremidade de 

colmeias constituídas por troncos ocos serrados. Também é necessário fazer as colmeias racionais com madeira resistente.

Irara, tatu, macaco da meia-noite, furão, tamanduá mirim, quatis são exemplos de mamíferos que podem atacar colmeias de meliponas em busca de mel. No entanto, são considerados bem menos perigosos para as abelhas sem ferrão do que certos humanos.

O ser humano, muitas vezes sem perceber, é um dos maiores inimigos das abelhas sem ferrão. O uso indiscriminado de agrotóxicos, o desmatamento e a urbanização descontrolada reduzem o habitat natural e expõem as colônias a riscos de intoxicação, perda de alimentos e desequilíbrio ecológico.

Apesar de parecerem vulneráveis, as abelhas sem ferrão possuem estratégias eficazes de defesa contra inquilinos indesejados. As entradas das colmeias são muitas vezes estreitas e protegidas com cerume, reduzindo o acesso de invasores maiores. Algumas espécies mantêm abelhas “soldado” de guarda, especialmente atentas a intrusos.

Além disso, o uso de resinas vegetais (propolis) ajuda a selar áreas vulneráveis e até embalsamar inimigos mortos, como formigas e larvas invasoras, evitando a contaminação da colônia.

Vizinhos Associados: Relacionamentos Neutros ou Benéficos

Nem todos que habitam ou circulam próximo a uma colmeia Meliponini representam ameaça. Muitos organismos estabelecem relações neutras ou até benéficas com as abelhas sem ferrão. Esses vizinhos associados podem contribuir para a defesa, a limpeza ou o equilíbrio ecológico do ambiente, atuando como aliados indiretos da colônia.

Alguns pequenos animais convivem pacificamente com as colmeias, geralmente ocupando a parte externa das caixas ou as proximidades do meliponário. É o caso de aranhas e lagartixas, que, longe de serem inimigas, ajudam a controlar pragas, alimentando-se de formigas, moscas e outros insetos nocivos. Sapos e pequenos répteis também podem desempenhar papel semelhante, desde que não tenham acesso direto à entrada das colmeias.

Existem Meliponíneos que são eles que se estabelecem no interior do ninho de certas formigas, ocupando para seu uso exclusivo uma parte do formigueiro. São também vizinhos tolerados e associados desde que os ninhos contíguos não sejam rompidos por pessoas e outros predadores. Havendo um rompimento dos ninhos, 

formigas e abelhas se misturam e lutam entre si. São associados apenas como vizinhos autônomos. Não são inquilinos uns dos outros.

Freqüentemente, o MARIMBONDO CAVALO (Polistes canadensis L.) faz ninhos sob as colmeias. Trata-se, aliás, de um inseto útil, por destruir certas pragas e, provavelmente, por matar também outros insetos daninhos. Vários marimbondos nidificam embaixo das colmeias. Isso é inconveniente para o meliponicultor, que fica sujeito a ferroadas, mas a vizinhança de algumas espécies de vespas pode proteger as abelhas, defendendo-as contra certos inimigos.

Ao abrir uma colmeia de abelhas sem ferrão é possível ver uma multidão de pequenos bichinhos brancos, cor de palha ou castanhos, do tamanho da cabeça de um alfinete ou geralmente menores. Com uma lente, pode-se notar que possuem quatro pares de patas. Pertencem à classe Arachnida, ordem Acarina. Esses ácaros devem ser considerados basicamente como inquilinos inofensivos.

É o caso, também, de algumas  aranhas e lagartixas, que, longe de serem inimigas, ajudam a controlar pragas, alimentando-se de formigas, moscas e outros insetos nocivos. Sapos e pequenos répteis também podem desempenhar papel semelhante, desde que não tenham acesso direto à entrada das colmeias. Por isso, são necessárias medidas preventivas como a instalação de dispositivos na entrada da colméia visando a sua proteção. 

Certos fungos simbióticos também podem ajudar na decomposição de matéria orgânica, contribuindo para a higiene natural do ambiente ao redor da colmeia, especialmente em áreas de mata.

Além disso, a instalação de colmeias de diferentes espécies próximas, como Melipona quadrifasciata (mandaçaia) e Scaptotrigona depilis (tubi), pode incentivar o comportamento pacífico entre as colônias, desde que haja recursos suficientes para todas. Nesses casos, é comum observar abelhas visitando as mesmas flores sem disputas, reforçando a importância de um ambiente equilibrado.

Os Inquilinos

Além dos inimigos e dos vizinhos benéficos, existem também os inquilinos, organismos que vivem dentro da colmeia ou em seus arredores imediatos, utilizando os recursos da colônia para se alimentar, se abrigar ou se reproduzir. Alguns são inofensivos ou até úteis, mas outros podem causar sérios problemas, atuando como parasitas silenciosos.

O meliponicultor muitas vezes encontra pequenos besouros (Coleópteros). São cegos e sem asas, possuindo cor castanha-clara ou escura, algo brilhante. Esses simpáticos bichinhos são simples inquilinos inofensivos, vivendo unicamente como hóspedes de Meliponíneos. São transportados para longe agarrando-se às abelhas antes delas voarem.

Muitos pequenos insetos encontram abrigo dentro das colmeias de abelhas sem ferrão. Besouros do gênero Platypsyllus, por exemplo, são encontrados entre os potes de mel e de cria, alimentando-se de resíduos e detritos — uma forma de comensalismo, onde o inquilino se beneficia sem prejudicar a colônia.

Por outro lado, há visitantes menos bem-vindos. Algumas moscas (como Phoridae) conseguem se instalar dentro da colônia e botar ovos nos potes de cria. Suas larvas se alimentam das crias em desenvolvimento, prejudicando seriamente a população da colônia e comprometendo o ciclo reprodutivo.

Nem sempre é fácil distinguir se um inquilino é amigo ou inimigo. Em muitos casos, sua presença passa despercebida até que os efeitos negativos fiquem evidentes. Por isso, é importante observar sinais como:

  • Diminuição da população de abelhas
  • Mau cheiro na caixa
  • Alterações nos potes de mel ou cria
  • Atividade incomum de outros insetos

Além disso, algumas espécies de fungos e bactérias oportunistas podem se instalar em colmeias mal higienizadas, provocando fermentação indesejada do mel ou decomposição da cera.

Considerações Finais

O universo de uma colmeia Meliponini é muito mais complexo do que aparenta. Além das próprias abelhas, há uma diversidade de organismos que interagem com a colônia de formas diversas — como inimigos predadores, vizinhos benéficos e inquilinos oportunistas. Compreender essas relações é essencial para manter um meliponário saudável, produtivo e em equilíbrio com o ambiente ao redor.

Ao conhecer aqueles seres extra “colônia”, o meliponicultor se torna capaz de agir de forma preventiva, promover a biodiversidade positiva e evitar perdas por parasitismo e/ou predação. Um manejo consciente inclui não só o cuidado direto com as abelhas, mas também com o ecossistema em que elas estão inseridas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *